A “falência” da inovação tradicional

O conceito de “inovação” tem sido amplamente utilizado em diferentes contextos, como a criação de novos produtos, o aumento de performance em processos, desenvolvimento de novos modelos de negócio, entre outros. A definição de inovação utilizada por empresas e autores pode variar, mas é possível notar a convergência para a ideia geral de “resolução de problemas”, que no meio empresarial tem como objetivo a melhoria do resultado financeiro. Porém, essa visão da inovação além de insuficiente é, em alguns casos, também perigosa, por utilizar como indicadores de sucesso apenas aqueles relacionados ao negócio, em detrimento de outros associados com os fatores que sustentam a vida no planeta como um todo.

Essa perigosa situação é causada por uma combinação de: 1) falta de clareza quanto ao papel do equilíbrio ecológico para a continuidade da jornada humana na terra; 2) falta de sensibilidade com o valor intrínseco da vida, independentemente de seu aproveitamento econômico; e 3) falta de um modelo de vida e produção alinhada com a dinâmica natural e, portanto, sustentável. Como consequência, não é raro vermos “soluções inovadoras” que demandam mais de recursos obtidos na natureza e produzem mais resíduos, além de alimentarem uma lógica de consumo pautada na obsolescência programada, na busca por status e na segregação social.

Frente a esta situação, diferentes iniciativas têm buscado fazer com que a inovação não apenas resolva um problema de negócio, mas que também crie abundância para as partes envolvidas, que muitas vezes não são os clientes. Tais partes envolvidas podem incluir comunidades marginalizadas, ecossistemas frágeis, trabalhadores inseridos no processo, poder público associado ao local de produção e distribuição de produtos, entre outros. Tais iniciativas podem ser internas ou externas às organizações e utilizam diferentes abordagens quanto à processos, técnicas e ferramentas.

Uma das abordagens que se propõe a criar inovação de maneira mais abundante e inclusiva é a biomimética, que pode ser definida como “inovação inspirada na natureza”. Nela o processo criativo se vale de modelos naturais como plantas, animais e até processos biológicos, para adaptar suas soluções ao contexto humano. Como exemplos, podemos citar a mimetização de formatos corporais visando melhoria de aerodinâmica no transporte público (como o caso do martim-pescador e do trem bala), da arquitetura de habitações de cupins para o ganho de performance térmica em prédios e da superfície da pele de tubarão para a criação de artefatos hospitalares com baixa adesão microbiana, entre outras tantas.

A busca por modelos naturais em si não resolve os problemas citados anteriormente, mas apenas amplia o repertório para o processo criativo. Porém, a biomimética possui outros dois pilares que, somados a este primeiro, a tornam uma abordagem poderosa de inovação:  a utilização de métricas naturais para a validação do design da solução e o entendimento da natureza como mentora e não como fonte de recursos para a espécie humana. Enquanto o primeiro pilar (“natureza como modelo”) potencializa as ideias, o segundo (“a natureza como medida”) se encarrega de garantir que a idéia seja sistemicamente viável e o terceiro (“a natureza como mentora”) fornece uma nova forma de encarar a natureza, da qual também fazemos parte.

Um processo de inovação que desconsidera o aspecto humano e ambiental pode ser mais interessante economicamente em curto prazo, mas mesmo assim, ainda será um processo falido, por não ser capaz de se sustentar a médio e longo prazo de maneira saudável. A inovação que resolve um problema, mas cria outro ainda pior, precisa ser encarada como uma ameaça e não uma opção.

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